O Areópago de Itambé

Em Pernambuco, no século que expirou, a Liberdade partiu do seio das Sociedades Secretas, dos lábios dos adeptos da MAÇONARIA para os ouvidos da multidão.

Desde 1800, que se doutrinavam o povo, inoculando-se-lhe sentimentos puros, as ideias mais adiantadas e incutindo-se-lhe no espírito que “o nosso Pai que está nos céus criou livres todos os homens”, na expressão de Bernardo Luís Ferreira Portugal.

Quantas tentativas fizeram os pernambucanos para gritar a todos os povos livres: somos irmãos! Quanto sangue derramaram nossos avós na conquista da Liberdade!

O primeiro estabelecimento fundado, o primeiro centro que começou a estudar as ideias adiantadas foi o AREÓPAGO DE ITAMBÉ, fundado pelo Dr. Manuel Arruda da Câmara, sábio paraibano, botânico, médico, formado em Montpellier, partidário exaltado das ideias francesas.

Do AREÓPAGO faziam parte o capitão André Ferreira Dias de Figueiredo e os padres Antônio Félix Cardoso, Miguel Joaquim de Almeida, Monsenhor Muniz Tavares, o bispo Azeredo Coutinho, José Ferreira Tinoco, Antônio D’Albuquerque Montenegro e João Ribeiro Pessoa além dos irmãos Arruda Câmara, os irmãos Suassunas e os irmãos Luiz e José de Paula Cavalcante de Albuquerque.

Talvez o nome AREÓPAGO, aliás, na Maçonaria, significativo de reunião de maçons de graus elevados, ocultasse os desígnios maçônicos das reuniões dos sócios, porque era crime de pena última o cidadão professar ou se mostrar simpático à poderosa Sociedade que, ainda hoje, é a mola da civilização e tem resolvido a maioria dos problemas sociais. Talvez fosse simplesmente secreto o Douto Grêmio, mas tudo leva a crer que esse AREÓPAGO, de que a história fala guarda tradições, era uma LOJA MAÇÔNICA, pois, tendo vindo o Dr. Arruda Câmara, da Europa, onde se iniciara nos poderosos e delicados mistérios da democracia, trazendo o exemplo vivo da queda da Bastilha, fundara uma associação semelhante à em que fora iniciado no Velho Mundo.

Além disso, a Maçonaria naquele tempo, como a encontramos na Independência do Brasil, era mais uma associação política com o juramento dos irmãos fazerem a Pátria Livre, do que uma Sociedade de filantropia e beneficência, como hoje.

Este juízo cresce tanto quanto é certo que do AREÓPAGO DE ITAMBÉ nasceram as famosas “Academias”, que outra coisa não eram senão duas Lojas Maçônicas.

Domingos José Martins – diz o padre Martins – um dos chefes da Revolução Pernambucana de 1817, sócio das “Academias”, associara-se ao general Miranda, chefe escolhido para emancipar a América espanhola. Domingos pretendia introduzir no Brasil o plano de Washington. Depois da Revolução dos Estados Unidos, os princípios democráticos se espalharam pelo Brasil e muito singularmente desde que foram adotados pela Revolução Francesa, aumentando o governo português o rigor e vigilância para que a doutrina democrática não tivesse publicidade. Porém, os adeptos disfarçaram-se, convertendo-a em um grande segredo, unicamente conhecido e revelado a pessoas de confiança.

Claro está, portanto, que essas Sociedades Secretas, quer se chamaram Areópagos, Academias, Lojas, Oficinas, Universidades ou coisa semelhante, eram LOJAS MAÇÔNICAS para aqui transplantadas pelos espíritos que se iniciaram na Europa ou nos estados Unidos, diferindo de nome justamente para fazer confusão, desnortear o governo português, não levantar suspeitas e melhor propagar as ideias de democracia, disfarçadamente.

Quem conhecer a história da Maçonaria e a vir separada da lenda, não nascida na margem de Eufrates nem no Templo de Salomão, mas transformada de confraria de York, onde só tinham assento os artistas, para a Franco Maçonaria onde as ideias liberais começaram a imperar, espalhando-se por toda a civilização, para cogitar do desenvolvimento político de toda a Europa, derrubando dinastias, pondo fim à inquisição, acabando a tirania dos reis e proclamando a liberdade dos povos; quem conhecer a história dessa poderosa Sociedade que tanto medo causa aos déspotas e aos tiranos e tanto tem concorrido para a Independência dos Povos, verá pela descrição que o AREÓPAGO, diz Dr. Maximiano Machado, a ASSOCIAÇÃO DE ITAMBÉ, era um dos Templos Maçônicos semelhantes aos da Europa e o PRIMEIRO QUE SE INSTITUIU NO BRASIL.

Era o AREÓPAGO uma sociedade política intencionalmente colocada na raia das Províncias de Pernambuco e Paraíba, frequentada por pessoas salientes de uma e de outra parte e donde saíam, como de um centro para a periferia, sem ressaltos nem arruídos, as doutrinas ensinadas. Tinha por fim tornar conhecido o estado geral da Europa, os estremecimentos e destroços dos governos absolutos, sob o influxo das ideias democráticas. Era uma espécie de magistério que instruía e despertava entusiasmo pela República, mas em harmonia com a natureza e dignidade do homem e ao mesmo tempo inspirava que traria a Independência e o Governo Republicano a Pernambuco.

A primeira tentativa do AREÓPAGO DE ITAMBÉ foi tornar Pernambuco independente, sob a proteção de Napoleão Bonaparte. Não um simples pensamento, mas uma ideia que não teve execução devido a um malogro inesperado. Já José Francisco de Paula Cavalcante se achava em Lisboa como agente acreditado e Francisco de Paula Albuquerque Montenegro tiveram poderes de seguir para o Rio da Prata e Nova York, no mesmo caráter, ambos filiados ao AREÓPAGO, quando uma denúncia fez o primeiro ser preso e mais tarde solto à falta de provas. E, quando Napoleão expiava em Santa Helena as culpas de conquistador, momentos após a Revolução de 06 de março de 1817, ainda Pernambuco fez uma tentativa, por intermédio de seu emissário nos Estados Unidos, para arrancar dos penhascos o grande prisioneiro que anteriormente lhe prometera independência, dando-lhe pouso em Fernando de Noronha, até que os seus melhores oficiais o colocassem novamente no trono de França, que ele tanto engrandeceu.

Não podendo os governos da Europa corromper as sociedades maçônicas nem embargar seus progressos, introduziram nelas espiões, no intuito de persegui-las com receio da invasão das novas ideias. As ideias começadas pelos dois Arrudas (Manuel Arruda da Câmara, habilíssimo médico naturalista e Francisco Arruda da Câmara, doutor em Medicina, ambos residentes em Goiana e de grande preponderância no AREÓPAGO), pelos vigários de Santo Antônio e Recife, cresceram e propagaram-se pelos estabelecimentos das Lojas maçônicas, nas quais excluídos das suas sessões particulares os maçons europeus, a maior parte dos quais eram filhos do país, seduzidos desde a chegada de Domingos José Martins, se fizeram conspiradores.

O AREÓPAGO DE ITAMBÉ, sendo uma sociedade secreto-política era, em verdade, uma LOJA MAÇÔNICA fundada para cogitar da liberdade do povo pernambucano, de acordo com o que sucedera na França, nos Estados Unidos e estava combinado realizar-se em toda a América Latina. FOI ESSE AREÓPAGO A PRIMEIRA COLUNA DE UM TEMPLO MAÇÔNICO LEVANTADA EM SOLO BRASILEIRO e sobre o qual, a par de estudos científicos, de combinações políticas para a Independência da Pátria, se rendeu sincero culto ao Supremo Arquiteto do Universo.

Aqueles que frequentaram o AREÓPAGO DE ITAMBÉ, nele receberam as primeiras lições de patriotismo, beberam as primeiras taças do sentimento de Igualdade e Fraternidade, ouviram pela primeira vez o Hino da Liberdade, sonharam uma Pátria independente da metrópole.

O AREÓPAGO DE ITAMBÉ foi o primeiro, a estação inicial de radioatividade democrática, o portador dos mais elevados ideais de INDEPENDÊNCIA, DE REPÚBLICA E DE DEMOCRACIA.
Itambé, março de 1984.

(a) VenGetúlio César Rodrigues Guedes (in memoriam)

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